E o destino continua sendo a Ilha Grande...


Aqui estou eu, de novo no mar, rumo a Ilha Grande!
Se existisse piloto automático em uma canoa havaiana, a Guardiã teria gravado em seu HD todas as rotas com destino a Ilha Grande. Este relato conta a trajetória de ida e volta entre a Vila do Frade, em Angra, e a Praia de Araçatiba, na Ilha Grande, em uma remada de 51 quilômetros durante dois dias do carnaval de 2013. 

Uma vez mais me vejo remando com a proa da Guardiã apontada insistentemente para a Ilha Grande, predestinada a chegar neste horizonte sempre buscado.


Proa da Guardiã navegando para Ilha Grande.
Mais a frente, Fabiano remando de stand up. 
A Baía da Ilha Grande possui 365 ilhas - uma para cada dia do ano - sendo a mais bela, a mais visitada, a mais encantadora e maior de todas o destino preferido de muitos que concordarão comigo: Ipaum Guaçu, na língua indígena, ou simplesmente Ilha Grande. Desde que a visitei pela primeira vez (acho que em 1999) até a última vez - dias atrás - sinto incansável fascínio por aquele imenso pedaço de terra que emerge no mar da Costa Verde e atinge uma altura que chega até 980 metros de altitude e imponência da Natureza.

"Remar até Ilha Grande". Como esta frase não sai da minha mente!? Como a repito sempre, seja lá onde for o ponto de partida!? Desta vez, o ponto de partida foi o Condomínio do Frade, a 40 quilômetros de Angra, pela estrada. 



"Remar até Ilha Grande" - uma frase que não se cansa nunca de florear minha mente e meus planejamentos de remadas.

A saída foi por volta do meio dia da segunda-feira de carnaval. A tripulação da expedição: eu e meu namorado. 


No gramado do Condomínio do Frade, os preparativos para a partida, com a atenção necessária para todo o início de expedição: checagem de material, dos equipamentos e dos pertences.

Munidos de bastante água e alimentos energéticos, eu de OC1 e Fabiano de stand up, demos início à remada de 28 quilômetros tranquilamente percorridos em 4 horas, serpenteando entre as ilha da Baía de Angra, sendo mais da metade deste tempo com vento contra e grandes lanchas cortando os mares por todos os lados. Em alguns momentos as ondas promovidas por elas ajudavam a nos dar impulsos na remada, em outros balançava as águas deixando um rebuliço emaranhado de espumas para transpor. Apesar da nossa esclarecida preferência por embarcações a remo e a vela, foram estas motorizadas que fervilhavam nos mares de Angra durante o carnaval que por duas vezes pararam para nos indicar o caminho da Praia de Araçatiba quando assim solicitamos. 

Na primeira vez, uma lancha de três andares e 72 pés com animados amigos bebendo cerveja não souberam indicar a rota da praia perguntada. Alegremente nos chamaram de loucos e nos convidaram diversas vezes para subir a bordo com nossas pequenas embarcações para seguirmos com eles até o destino procurado, onde descansaríamos e beberíamos cerveja. Agradecemos duplamente o convite e a simpatia e seguimos remando na dúvida entre qual longínqua faixa de areia seria finalmente a Praia de Araçatiba, na imensa Ilha Grande avistada ao longe. Quando confirmamos, minutos mais tarde, com a tripulação de outra embarcação a motor, tivemos certeza de que nossa intuição e senso de direção estavam corretos desde o início mas concluímos que, para remadas como esta, um bom GPS de navegação é mais apropriado que o usual GPS de treino que normalmente usamos. Sabendo disto deste antes de sair, Fabiano marcou no GPS de pulso o checkpoint em nosso ponto de partida no Condomínio do Frade. Desta forma, ainda que houvessem pequenas dúvidas sobre a rota do destino, uma seta no visor do relógio garantiria a indicação correta do caminho de volta, mesmo se o tempo se fechasse em névoas ou uma chuva forte escondesse as montanhas que nos orientavam na navegação.


Ao longo da faixa que margeia o lado Sul da Ilha Grande corre um grande canal de navegação por onde passam gigantes navios de carga que vão e vem do Tebig, o Terminal de Petróleo da Baía da Ilha Grande. Navios não freiam nem fazem curvas com a facilidade das lanchas, por isto deles eu tenho mais medo que destas últimas. Para se precaver de acidentes inusitados (já imaginou ser atropelado por um navio de proporções colossais!?), é importante estar atento ao passar pelos canais de rota de navios. Este treino de atenção eu pratiquei ao longo dos últimos oito anos da minha vida desde que comecei a remar nas águas da Baía de Guanabara. "Atravessar a poça" a remo tem dessas coisas: você escuta aquela longa buzina do navio - "uooooooooooooooooooommmmmmmmm" - e sempre tem a sensação de que foi pra você que o comandante buzinou! Nesta hora a gente aperta o remo mais forte e acelera o ritmo da remada pra sair da frente do gigante sem freio! 



Aguardando a passagem do gigante sem freio para continuar a remada rumo a Ilha Grande, vista ao fundo.
Duas boias demarcam a passagem dos navios neste canal da Ilha Grande - uma vermelha (chamada no mundo náutico de "encarnada") e outra verde. Ao ver um navio que rumava para o mar aberto se aproximando, paramos perto da boia vermelha, antes de atravessar o canal, para esperar o gigante passar. Estávamos a uns 40 minutos do nosso destino e ainda restava uma discreta necessidade de confirmação se aquela que víamos pequena diante de nós era mesmo a Praia de Araçatiba. Aproveitamos a passagem da lancha Pilot - aquela que sempre embarca e desembarca o prático dos navios - para obter a derradeira resposta: sim! Estávamos certos! E seguimos felizes e remando até mais forte - já nesta hora sem o vento contra - rumo a Ipaum Guaçu.

Por volta das seis horas da tarde chegamos ao nosso destino, a casa da minha tia Ângela, onde eu imaginava que encontraria primos reunidos e rostos familiares. Subimos no cais e lá fui eu escadarias acima chamando pelo meu primo Gegê. Qual não foi minha surpresa, a casa estava alugada para desconhecidos! 


Fim de linha da remada de ida. Praia de Araçatiba - Ilha Grande.
As pessoas jovens e extremamente acolhedoras que estavam na casa de tia Ângela e tio Galindo se interessaram pela história da nossa remada e insistiram diversas vezes para que ficássemos no quarto que estava vago e comêssemos o estrogonofe que haviam feito para o jantar daquele dia. Enquanto comíamos, nos rodearam com perguntas sobre o tempo de remada, a frequência com que fazemos isto e todo tipo de curiosidade que as pessoas têm quando vêem os viajantes do mar. 


Breves amigos que se eternizaram na história desta singela expedição de canoa havaiana e stand up.
Naquela noite, saímos a passear despreocupadamente pelas areias ainda quentinhas daquele dia de verão. Em meio a movimentos carnavalescos, música alta e pessoas perambulando animadamente pela praia, encontramos um lugar tranquilo para recostar em um barco de pesca e observar a noite. Antes, passamos em uma venda para comprar água para a volta e pão para o café da manhã. A partida no dia seguinte foi às sete e meia da manhã.


No conforto da areia, encostados em um barquinho de pesca para observar a  tranquila noite de carnaval que desfrutávamos na Ilha Grande, depois de uma bela remada.
A remada de volta, no dia seguinte, foi uma tranquilidade. Vento quase zero (3 ou 4 nós de velocidade) e mar calmo. Cruzamos com menos lanchas e mais veleiros que o dia anterior. 

Pouco vento na remada de volta e as duas formas de estar no mar que mais admiramos: remando e velejando.
Assim como na ida, revezávamos as embarcações de vez em quando. Encontrar um ponto de equilíbrio entre você e o mar e traçar um ponto no horizonte para onde remar: assim é avançar uma remada em uma prancha de stand up. Um exercício de presença constante da mente, que lembra ao corpo todo instante a importância de se manter em equilíbrio. 

Um dos momentos em que assumi o stand up na Costa Verde: equilíbrio e contemplação.
Mar verdinho e 365 ilhas para descobrir a caminho da Ilha Grande.
Entre um descanso e outro, mergulhos para refrescar e barrinhas de proteína para se alimentar. Amendoins salgados nas remadas são ótimos para combater a queda de pressão. Uma bagagem bem montada é um dos segredos para o sucesso de uma expedição. Uma muda de roupa seca deve ficar no ponto mais intocável da bagagem. Independente de quantas noites passará na travessia - sendo de uma a quatro noites - a quantidade de roupa pode ser a mesma: a roupa molhada no corpo e a muda de roupa seca em uma bolsa estanque. A roupa molhada é a que estará com você durante todos os dias de remada e durante as incursões em terra, de dia. A roupa seca é a que você usará para dormir ou também quando tiver a certeza de que não irá se molhar. Carregar pouco peso na canoa é fundamental para que o desempenho físico e psicológico da remada não sejam alterados.

Bagagem e remo reserva amarrado no iaco traseiro da canoa. Também no iaco traseiro, uma faca de mergulho de cabo amarelo (se afundar em águas rasas, é fácil  encontrá-la por causa da cor) bem afiada que pode ser útil para diversas situações. Certa vez precisei muito cortar fios emaranhados de nylon que enforcavam pescoço e nadadeiras de duas tartarugas marinhas na Enseada de Jurujuba, em Niterói, e passei um sufoco por não ter uma faca.

Bagagem no mar.

Estes foram dois dias muito bem aproveitados do nosso carnaval no mar. E esta foi mais uma remada ao meu destino preferido. Quando quero dizer para mim mesma que algo bem difícil pode parecer bem fácil eu digo: "Ilha Grande é logo ali". Que seja "logo ali" para todos nós! 

Fabiano remando, o tempo fechado no continente, que ficara para trás, e a Ilha Grande "logo ali" à sua frente.
Aloha, imua e até a próxima postagem!
Luiza Perin

Comentários

  1. lindo esporte ! Alessandro Infante.

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  2. Inspirador. Obrigado por seu relato. em breve inicio minhas aventuras também.

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